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Comércio/Indústria - 01/05/2015

“CINE PENCA” (e outras boas lembranças)

Publico hoje um artigo do professor Sérgio Luiz de Paiva Bolinelli escrito em 1973.

digitalização e pesquisa ds fotos de Nelson Bassametti

1949 . Coroavam-se de êxitos os esforços de Pe. Albino.  Alguns padres italianos chegam a Catanduva para o pastoreio das almas. A maioria, ainda jovens, traziam dentro de si todo o vigor para o desenvolvimento de um ideal. Vieram para vencer e venceram, apesar de todas as dificuldades e tropeços que tiveram que enfrentar.

De todos que por nossa cidade passaram, quem não se lembra do Pe. Silvio Gasparotto que chegou a jogar futebol de batina e tudo; do Pe Orlando Visconti e do Pe. Hélio Lupano que também trabalharam, e bastante, na Paróquia de Nossa Senhora Aparecida; do Pe.Attílio Carrone que animava todo mundo com seu inconfundível “Viva, Viva”; do Pe. Ernesto Ferrero e do Pe Francisco Balzola que eram sempre encontrados na sacristia prontos para atender qualquer chamado, assim também como o Pe. José Valsânia, com sua voz maviosa, que deixou uma lacuna no “cantar feiticeiro”; ou ainda do Pe João Albera, o bom palmeirense?

Pois bem, o primeiro problema que surgiu à frente de alguns deles, foi de transformar um velho barracão que já havia sido máquina de arroz, em uma casa agradável e nasceu daí o Pensionato “Dom Lafayette”, na Rua Maranhão, esquina com a Rua Recife.

Esse Pensionato, masculino, que durou uns dois anos, abrigava moços de cidades vizinhas que estudavam aqui em Catanduva. Mas, os Padres Doutrinários não estavam contentes com a situação e, tendo à frente o Padre César Cauda, que tanto estimamos, foi fundado o Curso Primário tendo como primeiras professoras Ana Bolinelli, Daria Dias Figueiredo, Luzia Salgado, Lídia Maria Perosa e outras que programaram teatrinhos, quebra-potes e festas inesquecíveis.

Quiseram também, que aqui no Brasil, sua fundação crescesse e fundaram o Seminário “César de Bus”, e com isso, o Pensionato ganhava novos “fregueses”, meninos que se interessavam em seguir a carreira religiosa. Os problemas, entretanto, cresciam. A cada novo pensionista, novas despesas e apesar da colaboração dos Catanduvenses, o dinheiro sempre andava curto, mas nem por isso os padres desanimavam.

O Pe. César, que na década de 50 revolucionou a criançada feiticeira com a sua “missa das nove” com o seu entusiasmo, com os seus cantos, aulas de catecismo, distribuição de santinhos, com os seus “marianinhos” com suas projeções de gravuras, além da novidade da introdução do microfone durante a celebração da Santa Missa, das voltas de lambreta para seus afazeres diários, inventou uma fórmula para arrecadar semanalmente algum numerário.

A invenção era simples: a projeção de filmes no salão que existia nos fundos do Pensionato. Arriscou novas despesas, montou o salão, comprou as cadeiras, máquina e começou a funcionar com filmes alugados do Trida. Inicialmente aos sábados e domingos, para posteriormente, também às 4ªs feiras além da matinê de domingo. 

Como havia uma máquina só, a cada parte do filme havia uma pausa para a troca do rolo, oportunidade que era aproveitada pelos freqüentadores para “sair” ou comprar balas. E dessa forma funcionava o “cineminha” que os freqüentadores apelidaram de “Cine Penca” (derivado de Pensionato e porque sempre estava cheio de gente). O pessoal que durante a sua existência trabalhou com boa vontade, sem nada receber a não ser a satisfação da ajuda e uns filmes de graça era o seguinte: operadores – o próprio Pe César, Dario Bolinelli e algumas vezes João Delgado; Porteiros – Sílvio Pellizzon (que era o encarregado dos pensionistas), Antonio Olimpio Gregorin, Paulo Bolinelli e algumas vezes Antenor Bolinelli (que também se revezava com “lanterninhas”); baleiros – Domingos Ap. Azarite e este que escreve  (que era gamado por filmes e .... balas).

Antes de iniciar as sessões, ou nos intervalos, O Pe César anunciava, lá da cabine, os próximos filmes. E todo mundo gostava de ouvir que seria um filme de Roy Rogers, Tarzan, Gordo e Magro ou dos “Três Batatas”, ou melhor, dos “Três Patetas...”.

O salão era pequeno, com capacidade para umas 160 pessoas. Sempre lotado às vezes até com gente nos corredores, mantinha uma freguesia firme que não faltava às sessões. O preço era bem camarada e nas matinês ainda valiam os “cartões de catecismo” (que era uma forma de “puxar” a meninada para as aulas de catecismo – e quem não se lembra das compridas filas que se formavam pelas ruas após a “missa das nove?”).

Muitas coisas interessantes aconteceram durante seus sete anos de funcionamento. Uma delas era a bronca da assistência quando o mocinho beijava a mocinha ou quando apareciam artistas com as pernas de fora ou com “pouca rôpa” e o Pe César ficava passando as mãos na frente da lente de projeção. Outra era a forma encontrada pelos “moleques” de entrar sem pagar, pulando as janelas (depois de terem pulado um muro, entrado na cozinha, bebendo água ou vinho ou comido alguma coisa gostosa que estava na geladeira) ou entrando no “bolo” quando o pessoal voltava para a 2ª parte do filme.  Além disso, quando o tempo estava chuvoso e o Pe César estava na cabine, bastava dar um trovão para que ele soltasse um “Santa Polenta” e descesse rapidamente as escadas deixando a máquina funcionando sozinha, até que alguém o substituísse (era a “paura”, motivada pelas lembranças ainda recentes da guerra).

Tudo isso durou vários anos, com a platéia vibrando com os mocinhos, vaiando os bandidos, rindo com as “notas foras” das comédias ou chorando nos dramas (como numa “Paixão de Cristo” que chegou a ser exibido em 6 sessões num único dia. Mas um dia tudo acabou. A porta de entrada do Pensionato deixou de trazer os cartazes dos filmes.

Hoje, quem passa pelo Ginásio “Dom Lafayette”, todo novo, diferente, fica contente em saber que tem no Padre César o seu baluarte. Mas, acho que todos como eu, que ali estive como “menino de catecismo”, aluno do primário e baleiro, ficam com uma saudade danada do tempo em que era apenas “Pensionato”, com seu catecismo, com seu curso primário, com sua velha paineira e com o inesquecível “Cine Penca...”.

 Pesquisa no Arquivo do “Museu Padre Albino”

 

 

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